TRINCA URBANA - FRANCISCO MARINGELLI
Confira ao final uma entrevista exclusiva com o artista e clique nas imagens para ampliar.
ENTREVISTA COM O ARTISTA
1- O que acha que permanece em seus trabalhos que já
era uma preocupação do início da carreira?
“Desde 1979 algumas coisas permanecem no meu trabalho com a
gravura em relevo quando fiz as primeiras experimentações com a xilogravura.
Por exemplo, a identificação com o ato de gravar, de extrair a matéria, de
abrir sulcos é fundamental para mim sejam as matrizes de madeira, borrachas,
linóleo, Duratex, MDF, poliestireno etc, pois ao gravar em qualquer um destes
materiais aquele ato inaugural se renova.
Outro dado que permanece é a fascinação com os contrastes
de” luz e sombra” nas impressões com a tinta preta e o potencial de
multiplicação de cada estampa”.
2- Qual poderia ser o caminho para abrir um desenvolvimento
cultural no país que poderia seguir paralelamente com a formação educacional?
“Como no meu trabalho como professor atuei por 4 anos, de
1990/ 94 na rede estadual de ensino e, naquela escola de Osasco passei do uso
de uma sala convencional para um espaço específico para a experimentação com as
artes plásticas, digo que privilegiaria a capilaridade das redes públicas de
ensino para difundir os fundamentos das artes visuais, teatro, música etc.
Assim, visaria casar formação educacional e formação cultural. As unidades do
Sesc fomentam em suas programações tanto a formação quanto o desenvolvimento cultural,
mas pensando na abrangência mais ampla das ações, outros braços se fazem
necessários. Por isso, uma ideia seria renovar as premissas e ações das
oficinas culturais do estado e das casas de cultura municipais que encolheram
em suas programações nos últimos anos.”
3- Assumiria um cargo num conselho de cultura no governo?
"A esta altura da carreira, não teria disponibilidade
de tempo, mas isto não impediria alguma forma de participação eventual.
Portanto, descartaria um compromisso por um período de tempo determinado.”
4- O que você acha das exposições virtuais?
“No início quando se tornaram mais presentes no cenário das
possibilidades de apresentação e exibição, creio que tinha uma visão mais
limitada delas, isto é, seriam uma espécie de braço auxiliar em relação `as
exposições presenciais. Mas para a maioria dos artistas que não encontram
canais para viabilizar exposições presenciais, as mostras virtuais são uma
maneira para marcar uma atuação que em outros períodos, aqueles sem a Internet,
teriam menos canais para divulgar suas obras. Demorei a incorporar o Fecebook e
o Instagram à divulgação dos meus trabalhos e passei a fazê-lo como uma forma
de tentar apresentar o trabalho quase que simultaneamente à sua realização.
Mas, temos que mapear os limites desta estratégia, pois
muitas vezes esqueço de pensar como qual seria a forma de recepção das obras,
dos trabalhos colocados em rede. Como se dá a recepção de cada obra num
contexto de hiperprodução visual? Temos que lidar com isso.”
5- Comente, qual é o seu ponto de vista sobre a tecnologia?
“Uma vez que a tecnologia, a digitalização, o trabalho
em rede, plataformas é uma condicionante da produção capitalista na
contemporaneidade terceirizada, desterritorializada, quase naturalmente
passamos a adotar os instrumentos tecnológicos com meios de produção artística.
Este é fato que contribui para uma oferta mais ampla ainda de meios “à
disposição” dos artistas, como também ´este emprego da tecnologia nas artes é
uma forma de ampliar a extração de capital de uma invenção que fora utilizada
anteriormente para outros fins.”
6- O que vem funcionando e o que veio para ficar?
“Uso a tecnologia digital apenas como meio amplificador do
meu trabalho nas artes plásticas, não produzo a partir do digital e não saberia
indicar obras que permanecerão como paradigmáticas, estratégias de construção
de obras digitais que se tornarão “clássicas”. Mas dois artistas internacionais
me chamam a atenção na atualidade em relação à linguagem do vídeo e arrisco
dizer que permanecerão: um deles é o William Kentdridge que tem o desenho na
centralidade de tudo que realiza e, que atualiza processos cinemáticos antigos
que se casam perfeitamente à carga poética de duas obras. O outro artista é o
Bill Viola com as suas instalações de vídeo imersivas.”
7- Sabemos que para o artista classificar um trabalho como
"o mais importante" é difícil, mas dentre todas as suas produções
artísticas existe algum que te marcou muito, por quê?
“Sim, é muito difícil pois ao pretender destacar um trabalho
apenas tenho que proceder a uma seleção prévia de meia dúzia deles. Pensando
deste modo destaco a xilogravura “Amar a Amara SP” de 2010, medindo 2,10X1,60m,
pois ela toca os seguintes pontos; o pano de fundo de calçada e muro em
proximidade de “zoom”, a presença de um dos meus cachorros, a tipografia
gravada na matriz, a referência à cidade de SP que se pretendeu poética. Esta é
uma xilogravura que nasceu com a vocação para habitar algum muro de SP mas, foi
apresentada apenas em espaços fechados.”
8- Como você classificaria o momento da arte atual que vive?
Percebe alguma ruptura?
“Parto do princípio que muito do volume da produção
contemporânea me escapa, mas é possível a aferição da multiplicidade das
manifestações sejam elas pautadas no âmbito das artes plásticas, da arte
digital e dos hibridismos. Mas, parece-nos claro que não é pertinente afirmar
que há rupturas uma vez que vivemos um período histórico de pós-vanguardismos
referenciados nas vanguardas históricas do século XX compreendidas entre as
primeiras décadas do século XX e meados dos anos 60.
Concordo com a afirmação do teórico Ricardo do Nascimento
Fabbrini que afirma que os signos definidores das artes visuais estão já
decodificados e, que no panorama atual a combinação, articulação entre os
diferentes signos predominaria sobre a invenção. Bem, está sempre aberto o
campo para outras visadas, porém, a afirmação do Fabbrini comparada ao que vejo
e assisto me parece plausível.”
9- Nos conte se em 2023 vem novos projetos, onde e o quê?
“Neste ano, novamente, procurarei equilibrar meu trabalho
entre as aulas e a produção de novas estampas e de pinturas que são muito
essenciais para mim para pensar a cor nas gravuras em relevo empregadas num
sentido mais pictórico tanto no processo de separação de cores como na “matriz
perdida.” Manter os projetos coletivos com o Cláudio Caropreso, com a Merien
Rodrigues que leva à frente o Itinero Grapho. Quanto à exposições não há nada
em vista, programado, a não ser que algo surja improvisadamente. Porém,
intenciono levar meus livros artesanais, estampas-cartazes, estampas avulsas
etc, para as feiras de artes gráficas independentes tais como a Printa/ Sesc 24
de Maio, Matuta/ Ribeirão Pires, Folhetaria/ Centro Cultural São Paulo, Miolos/
Biblioteca Mário de Andrade e etc. Pretendo também continuar a colaborar com a
Banca Curva do Rodrigo Motta. Enfim, faz-se necessário buscar outros
canais de comunicação com o público além das galerias.”
10- A gravura é muito presente em suas obras, qual frase
você deixaria para refletir sobre essa técnica?
"Experimentei bastante com a pintura e com o desenho
com forma de expressão em si mesmo, mas pelo volume da produção e pela inserção
pública do trabalho, a xilogravura e outras variantes da gravura em relevo
tiveram maior difusão. As frases dizem respeito à gravura em relevo, em
particular":
“A xilogravura, a gravura em relevo possibilitam a fusão do
desenho com a talha da escultura” e, “A gravura em relevo serve àqueles que
para a invenção de imagens necessitam lidar com os valores táteis da matéria;
cortar, entintar e imprimir”
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